"Todo atentado cometido contra outra pessoa gratuitamente criará um demônio, que viverá na sombra do agressor, apenas aguardando o momento mais oportuno de lhe levar a sensação de estar no mais escaldante inferno. Não há como fugir da verdade, não há como fugir do resultado de nossas próprias ações"
Lembro-me de quando o sol nasceu, e seus raios refletiram em teu sorriso, eu não imaginava que na realidade estava a ofuscar meus olhos, e que essa cegueira temporária e alucinatória me levaria ao poço mais fundo, a um lugar que nunca foi meu lar, mas que na realidade era o que te aguardava, por tamanha miséria inata de tua alma podre e amaldiçoada, ó Artemis!
E ao por do sol as mãos de cadáveres puxavam meus pés, tentando fazer com que eu me atolasse mais e mais, e não pudesse dormir, enquanto vultos circulavam-me sussurando desgraças das quais eu não queria ouvir, obra das magias negras do demônio em forma falsa de deusa casta grega.
"Cão que late não morde - é o que as bocas sujas dizem, numa tentativa de naturalizar as ofensas indiscriminadas, e a má convivência em sociedade, quando na realidade não é bem assim. Podemos provocar bastante, mas em algum momento, a fera deixa de hesitar, e ataca aquele que tentou atentar contra sua natureza. Tolos são aqueles que acreditam em mentiras convenientes que servem apenas para distraí--los temporáriamente do fato de que cada ação gera uma reação, que cada semente é capaz de gerar frutos."
À meia noite acordei de um breve cochilo, e me vi em Raurava, cercado de fogo, queimando em brasa, sem ter para onde correr, sem mãos à me ajudar, inconformado em atenuada dor.
"Olhe para sí mesmo, olhe profundamente, se encontre, estenda sua mão, segure sua própria mão!" - dizia a voz da consciência, única parceira que me restou em todo esse inferno. Olhei, e apenas ví trevas, então pulei no que mais parecia ser um profundo abismo, mas era somente minha própria alma, e após nadar em minha própria escuridão, pude ver minha própria silhueta, estendi a mão, ví de longe uma mão estendida, e gritei "Segure, por favor! Segure!" e então pude sentir o toque, trazendo-me uma sensação de inefável paz...
Então abri meus olhos, intolerantes à luz, e eram seis horas da manhã, um novo dia, o sol brilhava novamente sob o céu que estava turquesa, belo como as águas que circundam Bornéu, enquanto os meus espíritos guardiões [O Poeta Caído e a Estrela da Manhã] traziam-me boas notícias de que Artemis finalmente estava condenada a todos os sofrimentos de todos os Narakas, um por um, e que finalmente eu estava livre de sua maldição destruidora.
Em tempos pude sentir novamente o prazer de existir, de estar vivo, e de respirar, alem da vontade de recuperar o tempo perdido e cumprir minha missão nesta existência.
Assim abri meus braços para o que estava por vir, enquanto relia sobras raras de emoções, pedaços de memórias tentando recordar a trilha que eu seguia antes de me perder...